O papai está me ensinando uma brincadeira nova. E pelo que pude perceber, só se precisa de uma bola, uma varanda sem varrer, não estar chovendo e muita coordenação motora. Porque, por mais incrível que pareça, não se pode usar as mãos!!! E o papai é muito exigente com essa regra. Toda vez que eu pego a bola ele grita “Falta”, e para a brincadeira. Eu só não entendi ainda o que é que fica faltando se eu sempre devolvo a bola para ele.
Na realidade, eu já percebi que o papai leva muito a sério esse jogo, e acho que é porque muita gente diz que meu bisavô foi um excelente boleiro. Engraçado, também já ouvi um monte de pessoas dizerem que minha bisavó era a melhor boleira da cidade e nem por isso as mulheres da família se entusiasmam com essa brincadeira. O papai mesmo é viciado em uma receita dela, chamada pela família de ‘Bolo da Ninoca'.
Meu bisavô integrou a seleção do Mato Grosso na década de 50, e mesmo que não tenhamos visto nenhuma referência a ele no Museu do Futebol durante as férias de inverno (que está melhor detalhada na postagem acima) aposto que nunca mais existiu um jogador corcunda tão habilidoso quanto meu bisavô França. Eu tenho certeza de que jogava com uma daquelas chuteiras em formato de coturno que vimos lá e, se tivesse sido convocado pela CBD na época, poderia até ter dado umas ‘botinadas’ em alguns uruguaios e garantido mais uma estrela na constelação canarinho.
Eu ainda não peguei muito o jeito de dominar a bola, mas acho que meu chute é especial, porque toda vez que eu consigo acertar o pé em qualquer direção o papai comemora como se fosse virada de ano. Eu, com toda minha modéstia infantil, me contento em aplaudir o magnífico lance que só minha genialidade esportista é capaz de apresentar aos meros expeta... espeta... expecta... bem, os assistidores do espetáculo.
Hoje, o único bolão que meu bisa joga custa R$ 10 a cartela e corre todo sábado pelo sorteio da loteria. Ainda bem, por que se fosse ele quem precisasse correr iam ter que dar um jeito de tirar da barriga dele a bola que ele engoliu sem mastigar quando ainda jogava e tinha dentes. Eu sei disso pelo formato perfeito de esfera da sua pança, e porque já ouvi outros velhinhos cuspidores dizendo que ele tinha ‘fome de bola’. Por outro lado, todo mundo concorda que se eu tiver a mesma habilidade que o bisavô França, metade do seu carisma e o dobro do juízo não é impossível que a camisa do tricolor mais pirateada daqui alguns anos tenha um CAIO em 3D nas costas.
E eu já posso até ver a manchete saudosista de capa da revista Placar anunciando, emblemática: “Rumo ao Deca: com o novo KaKaio”.
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